Outro dia ouvi um episódio do podcast “Gostosas também choram” da Lela Brandão em que ela falava sobre a dificuldade em fazer amizades na vida adulta. Ela apresentou o conceito de Moai, que significa grupo de amizade e apoio, e contou a história de uma senhora que se mudou para um bairro novo sem conhecer ninguém além dos familiares e um belo dia decidiu bater na porta dos vizinhos para convidá-los a fazer parte do grupo de amigos, o Moai, dela.
Fiquei pensando em como seria ser uma velhinha aposentada criando o meu Moai. Lembrei dos encontros de literatura que já participei e de como o sentimento de pertencer a um grupo de escritoras deu materialidade para o meu sonho. Por enquanto, eu sou uma velhinha professora e durante os meses letivos, o calendário não me permite escrever ou participar de eventos tanto quanto eu gostaria, mas cada frestinha que se abre num sarau ou lançamento de livro me dá um novo sopro para continuar. E aparentemente é isso o que acontece com quem cultiva um Moai.
Quando me comprometi a publicar regularmente na newsletter, foi com a intenção de encontrar amigas escritoras, criar o espaço do meu Moai. Esta edição, por exemplo, vem com todo o entusiamo de início de férias, mas volte duas postagens e leia o meu lamento sobre o começo do semestre letivo. É curioso que passo dia e noite pensando no que escrever aqui ou no romance (que caminha bem, obrigada), mas fazendo uma autocrítica das minhas publicações, vejo mais drama do que literatura de fato. Percebo que minha conversa dá voltas e voltas no mesmo lugar, como se eu observasse uma instalação que se move lentamente num complicado jogo de engrenagens da minha rotina contra espelhos que refletem a vida das escritoras que me inspiram no Instagram. É até bonito de olhar, mas uma hora cansa. E quem gostaria de estar no mesmo clube que uma velha ranzinza?

Digamos que eu já esteja com as chaves que autorizam a me autodeclarar escritora, já fiz a mudança para o bairro novo quando abri a conta no Substack e ajeitei minhas coisinhas em casa com um esquema de publicação mensal constante, além do layout bonitinho. Então, chegou a vez da própria moradora se arrumar para fazer terapia receber visitas.
Tem tanta coisa acumulada aqui na minha cabecinha, mas fica tudo soterrado por aquela instalação de engrenagens e espelhos. Por exemplo, os arquivos com exercícios esperando para terem seu processo comentado, ou contar de como descobri que o quinto capítulo do meu livro, na verdade, era um esboço do que devem ser os próximos seis ou sete capítulos e toda a pesquisa de referências que precisei aprofundar para continuar desenvolvendo a história.
Entre a minha cabeça e o teclado, está faltando mais mesa de bar ou uma cafeteria para conversar de verdade com outras escritoras, como deve ser em um Moai. No Instagram, que permite um contato mais imediato e frequente, até acontece um “eu também” comentado no story ou uma conversa rápida que não recebe a atenção que eu gostaria de oferecer e compartilhar. Esse episódio do podcast me fez entender que talvez eu precise, literalmente, sair das telas. A constância, não somente na escrita, mas também na conversa, deve arejar a casa e me livrar das engrenagens e espelhos.
Por isso não se espante se nos próximos dias eu aparecer na sua porta virtual e disser: “Oi, vamos ser amigas?”.
eu já me sinto sua amiga virtual toda vez que te leio, mas entendo a falta que faz amigas presenciais <3
Talvez essa escrita em círculos seja um reflexo do grande conflito interno que se apresenta quando decidimos (entenda esse decidimos como algo bem amplo, já que eu, Ana, não acredito que esta seja exatamente uma decisão autônoma) escrever um livro. Muitos processos ocorrem, a palavra pede um tempo que nem sempre temos para dar e muitas vezes, mesmo tendo, não damos, porque é doloroso ser esse intermédio de algo que vai além de nós.
Ps: Super topo a amizade ❣️