Ontem meu dia foi muito gostoso e tranquilo, daqueles que fazem a gente desejar que todos os outros fossem assim.
Na verdade eu não fiz nada demais, nem mesmo as coisas que tinha planejado como pendurar os quadros na parede, instalar a cortina ou fazer umectação noturna no cabelo. A tarde eu queria ter trabalhado no romance, eram as condições ideiais pra isso, mas o tempo passou e tudo o que fiz foi acertar as contas do mês.
Ontem era pra eu ter ido numa balada também, mas fui tomada pela preguiça de um rolê que começaria na hora em que os rolês deveriam terminar e a chuva foi gota d’água que eu precisava pra desistir. (eu precisava desse trocadilho, desculpa, obrigada).
Ontem eu fui ler mais um capítulo do Caminho do Artista. Ontem eu estava tranquila pq tinha um final de semana inteiro e sem planos pela frente. Foi um dia bom mesmo sem fazer nada do que eu queria.
Hoje estou ansiosa, talvez um pouco irritada também. Não por ontem que foi um dia bom, mas por hoje. Estou irritada e ansiosa pelo tempo presente. Mindfull of shit.
Alguma coisa quer me convencer que se eu tivesse feito umectação noturna no cabelo ontem, estaria me sentindo ótima hoje, mas não é verdade.
O problema é que hoje eu quero ser artista.
E por isso estou ansiosa e irritada. Na verdade estou é com medo.
Ontem o livro de auto-ajuda me dizia para dar nome às coisas.
Não é preguiça, não é autossabotagem, não é procrastinação, não é indisciplina.
É medo.
E o livro disse também que era pra listar as coisas das quais tenho medo e o que eu ganho por não estar sendo artista.
Ontem foi um dia ótimo pra entender isso.
Eu não fiz nada que pudesse se entendido como artístico, então eu tive um dia calmo, previsível e tranquilo. Foi um dia bom.
Quando eu não sou artista eu ganho a sensação de previsibilidade.
Eu tenho medo de ser artista e dos sentimentos que isso pode fazer emergir. Eu tenho medo de entrar em contato, de encarar de frente, de mergulhar no que sinto e me vasculhar em busca de matéria prima para o meu trabalho.
Eu tenho medo de expor os sentimentos que eu fui tão fundo pra esculpir e ser julgada, mal compreendida, subestimada, desvalorizada.
Eu tenho medo do que é bom também, da euforia de me encontrar em um texto bem escrito e que eu goste. E a responsabilidade de me comprometer em continuar escrevendo depois dele.
Tenho medo da escrita virar de fato o meu trabalho e eu deixar de gostar de escrever pq virou pura técnica e prazo pra cumprir.
Eu tenho medo de vencer esses medos mais uma vez e me comprometer a continuar e mais uma vez ser interrompida.
Estou chorando, então é esse mesmo o caminho do meu medo.
Se eu não for artista, eu não choro.
Se eu não for artista eu me anestesio com um quotidiano tranquilo.
Se eu não for artista eu ocupo meus pensamentos com formas de otimizar minha rotina pra ser mais produtiva e ter mais tempo livre pra poder ser artista.
Se eu não for artista eu vou usar uma tarde livre de sábado pra organizar minhas finanças.
Ser artista não é mesmo a escolha mais fácil. Os dias sem arte seguem tão suaves, enquanto os dias com arte são turbulentos. Será que vale a pena todo o sofrimento para produzir 1 coisa boa? Também me pergunto isso às vezes. Ser artista é uma escolha de todos os dias. Mas tem dias que a gente precisa descansar e pagar as contas e tudo bem também.
Não sei te explicar exatamente o motivo, mas ler esse seu texto meio que mudou a minha vida em um momento turbulento. Obrigada!